quarta-feira, junho 18, 2008

Isso é bom, né?

Então que quando questionaram sobre a falta de resposta, eu perguntei em que dia estávamos e lembrei que era aniversário dele. Em pensar que houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia. Centenas de quilômetros de distância, pouco efetivamente vivido ante ao dito e sonhado, e tudo remetia a ele.

Nunca soube onde cresceu, nunca conheci a mãe, a avó ou os amigos de que tanto ouvia falar. Não li o poema sobre suicidas, não fui à Praia Vermelha, nem ao Anhembi. Não enviei o telegrama de Aracaju ou do Alabama, não tomei conta dos olhos, e me fiz de tonta. Mas houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia.

Ironicamente, eu não chorei o que ficou engasgado depois do “sim, tô". Também nunca contei o que vi no fatídico Reveillón recifense, nem confessei o quanto torci por Campinas e por Ribeirão Preto.
Nunca o via, nunca comentava direito, não queria lembrar porque rasgava por dentro. Mas houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia.

Hoje a gente se esbarra à noite por ruas vazias, ladeiras carnavalescas de Olinda, consultas e discussões de caso, frases ébrias e sóbrias mal-educadas, torpedos meramente profissionais. Hoje o que mais me incomoda no encontro é que às vezes borra a lembrança idealizada. Hoje eu fico tentando me lembrar se são vinte e cinco ou vinte e seis anos. Mas houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia.

E foi tudo tão bonito, meteórico e privado que tem horas que parece que não passou de sonho. Daqueles tão vívidos que deixam a gente meio confuso ao acordar, sem saber se realmente aconteceu ou não. Sem testemunhas, letras vermelhas, fotos, fios de cabelo, abridores de vinho, ou quaisquer outras evidências que atestem a veracidade da coisa toda.
Sem sequer lembrar direito do timbre dos sussurros e da cor dos olhos. Sem que qualquer conversa atual remeta às de causar taquicardia da memória. Mas houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia.

E mal há telefonema, torpedo ou e-mail de congratulações. Seja por infantilidade e inabilidade pessoal de agir normalmente, seja pela falta de motivação suficiente. Mas há flashes de pão-de-mel, moletom escuro, sonetos e picardias estudantis.
Há idas a congressos, carinho pelo CAOC, relacionamentos à distância, e paixão pela cidade que quase arrebenta a retina de quem vê. Há também desejos tácitos e inefáveis de tudo de melhor que houver nessa vida. Porque houve uma época em que eu me lembrava todo santo dia ...


“A vida não é a que a gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la”.